segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Entre Estrelas



Uma singela fumaça esbranquiçada deslizou dos lábios dela, devido à noite extremamente fria que Londres tinha. Suas pequenas mãos pareciam que iam congelar a qualquer momento, igualmente seus pés. Ela sorriu ao vê-lo tirando o grosso casaco que vestia e dando-lhe de um modo meio sem jeito. “Obrigada”, sussurrou quase que silenciosamente, enquanto sua voz se perdia entre as buzinas e motores de uma rua movimentada.

― Para onde você quer ir? ― Questionou Richard, mirando à pequena. A mesma contemplava o céu acinzentado e perdia-se na própria imaginação, sem realmente prestar atenção no mais velho. ― Kaley. ― Chamou-a, finalmente obtendo a atenção da mesma. ― Para onde quer ir?

― Para as estrelas. ― Respondeu, singelamente. Um riso meio seco e enferrujado soou, fazendo outra risada doce soar no meio de toda imensidão cinzenta e barulhenta da cidade grande.

― Por enquanto eu não consigo te levar para lá, então escolha um local mais perto. ― Pediu carinhosamente. Recebendo um sorriso leve, quase que surreal.

As estrelas seriam um bom lugar para ir, pensou Richard, poderiam percorrer a imensidão negra do Universo e jamais voltarem para Inglaterra ou qualquer outro lugar da Terra. Viveriam eternamente entre as mais brilhantes e grandiosas estrelas, fazendo delas um local seguro e confortável. Como uma casa. Acordando dos próprios devaneios, o homem viu a adolescente correr pela calçada coberta de neve e entrar em um pequeno estabelecimento.

― Espere pequena Kaley.

Ao entrar no pequeno café, deparou-se com a garota, já sentada em um local afastado da porta, sem seu casaco e sem o cachecol preto que até então estava enrolado em seu pescoço. O mesmo foi até a mesa e sentou-se enfrente a menina, sorrindo e desviando o olhar rapidamente, ao ver uma garçonete chegando.

― O que vão querer?

― Um chocolate quente com chantilly. ― Pediu Kaley.

― E o senhor?

― Um café puro.

Ambos se miraram quando a garçonete saiu dali e sorriram. Cúmplices

― Você tem planos para hoje Richard? ― Perguntou. Sem malicia alguma, apenas curiosa. As mãos inquietas tomavam alguns saches de açúcar que havia sobre a mesa e as ordenavam lado a lado, sem realmente notar o que fazia. ― Eu queria andar de metrô, nunca andei, então você poderia me levar, não poderia? Se não tiver nenhum plano.

― Não acho uma boa ideia.

O silêncio se fez presente, devido aos pedidos chegarem e assim que a garçonete saiu, a garota de 19 anos fez uma cara triste e resolveu desviar sua mirada para o chantilly que havia sobre o chocolate quente em uma xícara.

― Por quê? ― A voz saiu rouca, quase que chorosa.

― Tenho 35 anos, não deveria nem estar aqui, tomando esse café com você. Sou mais velho e seu tutor de pesquisa.

― Mas eu não me importo.

― Mas o reitor da Universidade, seus pais e varias outras pessoas se importam.

O silêncio surgiu e permaneceu durante alguns minutos longos e tediosos, fazendo Richard tomar sua xícara de café inteira e Kaley conseguir acabar com o chantilly e quase com metade da xícara de chocolate. Richard repensou na sua resposta e deparou-se com a vontade de levá-la para algum lugar, algum lugar bonito e que a fizesse se sentir especial.

― Você quer ir paras estrelas? ― Perguntou Richard, interrompendo o silêncio, fazendo um sorriso sincero desenhar-se nos lábios da menina.

― Quero.

― Então vamos.

Richard deixou uma nota equivalente ao valor do que haviam pedido sobre a mesa e puxou a menina pelas mãos. O casaco e o cachecol foram levados pela mão livre da garota, enquanto saiam do pequeno café e iam em direção a uma escada que os levariam para o metrô.

Por ser noite, o vagão que pegaram estava praticamente vazio, os fazendo ter liberdade para sentar onde queriam. Kaley optou por brincar entre as barras de metais e ser um pouco criança ao se libertar dos problemas e deveres da Universidade, onde era do grupo de pesquisa de física. Richard acompanhava atentamente os movimentos infantis e alegres da garota, sorrido e esquecendo-se que era tutor de toda pesquisa de Kaley e do grupo da mesma.

― Nunca tinha andado de metrô. ― Revelou a garota, finalmente parando e ficando parada enfrente ao mesmo.

― Nunca? ― Espantou-se.

― Nunca. É a primeira vez.

― O que mais você nunca fez?

Kaley era uma garota da alta sociedade britânica, tendo motoristas e empregados a sua disposição. Estar ali, em um vagão de metrô, brincando, era algo quase que surreal e inimaginável até então para ela. Talvez sorte. Sorte de ter Richard para livrá-la de toda bolha que seus pais haviam feito ao redor dela.

― Nunca fui a parques. Esses ilegais, que tem pelos bairros pobres de Londres. ― Revelou, sentindo as bochechas vermelhas. 

― Não são ilegais, são apenas parques de pessoas normais. ― Comentou. ― Se prepara que na próxima estação vamos descer.

― E para onde vamos?

― Vamos ir para estrelas essa noite Kaley. 

Um sorriso dela surgiu. E apenas esse sorriso bastou para Richard perceber que não adiantava mais tentar fugir. Ela havia conseguido derrubar suas barreiras e o encantar com toda infantilidade que tinha.

Ao descerem do vagão, Kaley vergonhosamente pegou na mão de Richard e entrelaçou seus dedos, vendo-o hesitar por um momento, mas apertar seus dedos como se houvesse gostado daquele pequeno contato.

Estavam em um bairro do subúrbio e em um vasto terreno, havia um parque. Havia poucas crianças devido ao Inverno, mas as que estavam ali, corriam e gritavam alegremente. Kaley pareceu perdida e se encolheu no ombro de Richard ao levar um susto com um vendedor de algodão doce que passou gritando ao seu lado.

― Escolhe que brinquedo quer ir.

Montanha-Russa. Túnel do Amor. Brinquedos de pontaria, alvo, tiros. E por ultimo foram na Roda Gigante. Quando chegaram ao topo, Richard olhou para o céu cinzento e sorriu ao lembrar-se do pedido da menina. Ela queria as estrelas e ele também queria. Mas elas eram tão impossíveis de serem alcançadas, quase invisíveis no céu de Londres, quase que inexistente para os humanos. Os dedos enlaçados aos seus o fizeram perceber que não precisava ir para estrelas para se sentir longe de todos na Terra, bastava a ter ali por perto.

― Eu queria pular daqui e sair voando. ― Sussurrou para Richard, rindo.

― Eu também. ― Riu.

― Você é diferente quando estamos sozinhos, quando não estamos na Universidade.

Você me faz ser diferente quando estamos sozinhos.

Ambos permaneceram sorrindo, dentro de seus proprios pensamentos, enquanto a Roda Gigante se movimentava lentamente.

― Já estamos nas estrelas. ― Avisou Kaley em tom de brincadeira, olhando para ele e o vendo aumentar o sorriso. ― Obrigada por me trazer aqui.

― Sempre que quiser, vamos viajar pelas estrelas e conhecer novos planetas.

― Podemos voar?

― É só você querer pequena Kaley.

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